domingo, 6 de abril de 2008

Pensamentos...


Vai crescendo meu filho, com a díficil
luz do mundo. Não foi um paraíso
que não é medida humana, o que para ti
sonhei. Só quis que a terra fosse limpa,
nela pudesses respirar desperto
e aprender que todo o homem, todo,
tem direito de sê-lo inteiramente
até ao fim. Terra de sol maduro,
redondo, terra de cavalos e maçãs,
terra generosa agora atormentada
no próprio coração, terra onde teu pai
e tua mãe amaram para que fosses
o pulsar da vida, tornada inferno
vivo onde nos vão encurralando
o medo, a estupidez, a infindável
ambição, que nem sequer nos consentem
sermos senhores da nossa alegria,
de ser nosso o pão, nossa a palavra
de tudo estar em corrompidas mãos
de tanta e tão vil besta fardada,
de abutres que fizeram do saber
negócio mais rendoso que a sacristia.
Que faremos nós, filho, para que a vida
seja mais que cegueira e cobardia?



(Eugénio de Andrade)

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